Thursday, July 16, 2009

[Artigo para o Jornal do CAFIL-UERJ] Processos de Exclusão Social por Homero Fraga Bandeira de Melo – Professor de Filosofia

A vida humana compartilhada, a vida na Civitas Christiana, é pautada em cinco conceitos básicos: emancipação, individualidade, tempo/espaço, trabalho e comunidade. De toda forma, a projeção transcendente do objeto de poder sobre a imanência não é perfeita, pois que há dissidências. Podemos dizer que a exemplo do Homem-Máquina de La Mettrie algumas pessoas costumam abrir “a tampa do relógio” para saber como funciona – e isso Descartes ensinou e os Enciclopedistas levaram ao ápice (que se veja o comentário acerca da Física de Newton nas Cartas Inglesas de Voltaire). O mesmo se dá com o Estado. Desde Hobbes a apreensão de seu sentido não é mais a mesma – o poder foi desmascarado. Necessário era, e é, ao Estado criar, em torno de si, toda uma metafísica. Isto posto, a vida se reflete tanto na trandescentalidade inscrita no horizonte da imanência (admitindo-se aí a dobra operada pelo aparelho de Estado, quando da Questão das Investiduras no século XI A.D.) quanto na fissura, na dobra, no estriado do tecido operado pelos desvios e encontros com o Pensamento; então, a vida também é interrupção, incoerência, surpresa. Estamos falando, de toda forma, daqueles que acessaram a instância do Pensamento. A maior parte dos excluídos de nosso Brasil e do mundo preocupa-se muito mais com o que vai comer e/ou se vai “economizar o almoço para dar para a janta”. Bem, mesmo dentro das “categorias” inscritas acima da linha da pobreza, há aqueles que, de boa vontade, se alienam do processo do pensar. Dentro da chamada “classe-média” temos ícones da cultura anti-pensamento. Para essas pessoas, as necessidades reais deixam de ser as mesmas que para o contingente materialmente excluído. Suas mentes não são alimentadas com o potencial da diferença. Essas pessoas, guiadas pela máquina de guerra da propaganda (na qual optam por acreditar) se tornam sensíveis apenas a mudanças repentinas e estímulos, e, estes tem que ser constantemente renovados. A classe-média, motor da economia de consumo, não tolera mais o que dura. Esses valores se refletem nas classes pobres que ao tentar imitar “os mais ricos” não sabem mais o que fazer com o tédio. Não podem observar a eternidade infinita do eterno Domingo a tarde. Observamos que a exclusão se dá em vários níveis. Uns optam por excluir a si mesmos; outros estão automaticamente excluídos de qualquer inserção.

O neo-liberalismo, gestado a partir do fim do Welfare State, (tomo como marco da subida do neo-liberalismo e derrocada do Welfare State o ano de 1973), tinha como missão profanar as lealdades tradicionais, os direitos costumeiros e as obrigações que um Estado de Bem-Estar Social tinha para com seu povo. Para poder construir a nova ordem era necessário, primeiro, causar a subtração lenta, gradual e segura de direitos – implantação do “Estado mínimo” (ou “Estado-racional” – na linguagem neo-liberal). Max Weber já nos dizia em seu livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo que é necessário libertar a empresa de negócios dos deveres para com a societas ou a civitas.

A ordem econômica da qual somos vitimas hoje tem suas origens no “avanço para o norte norte-americano”. Os USA sempre possuem planos para os próximos 100 anos (a Igreja os possui para os próximos 200). Do crack da Bolsa de 1929, dos empréstimos às economias européias do entre-guerras (1919-1938), e, após, com a “reconstrução” alemã e japonesa, afirma os USA (tomo aqui por marco o ano de 1950) sua “soberania” diante do mundo. De toda forma, destruir de uma hora para outra o Welfare State geraria convulsões sociais e resistência – tivemos o exemplo de maio de 1968. O choque do petróleo de 1973 é o marco da efetiva implantação do modelo neo-liberal. A transição precisava ser serena. A noção de continuidade sistêmica era idéia imanente-mestra desse esforço racional. Necessário era impingir às pessoas os méritos de seu próprio empobrecimento. O sistema torna-se cada vez mais fluido, invisível – o Estado se retrai e se retira da vida cotidiana. Novos instrumentos racionais foram concebidos, então, a partir do governo Reagan, para admoestar e censurar os que não obtivessem sucesso dentro da implantação “serena” da nova ordem neo-liberal. As novas regras do capital mudam, aparentemente, “do dia para a noite”. A estabilidade não mais existe. A máquina de guerra de grupos, como o de Bilderberg, especializou-se na produção de crises, de “estouros de bolha” (como o do mercado imobiliário americano, recentemente). Não há mais códigos ou padrões que possam conformar nossa angústia e nosso tédio. O mundo fluido da ordem neo-liberal excluiu o tempo da reflexão e do pensamento (o tempo é o da execução de tarefas – para os indivíduos ainda empregados ou o da eternidade para os alijados do mundo capitalista; o único que se faz possível como antagônico ao da existência).

Os gestores da realidade imanente (e imagética) escravocrata (escravocrato-midiática) não são guiados somente pela própria imaginação. Eles mesmos não são livres para construir seu modo de vida a partir de sua vontade. Eles são dependentes do aparelho produtivo (de pessoas, no fim das contas) para obter os produtos que garantem o seu existir.

O poder é a motivação consciente ou inconsciente de muitos processos dados como adquiridos na vida social. Desde os pactos sociais e as obrigações diversas que a lei nos submete, os códigos de conduta em sociedade, tudo se conjuga para um fim. Foucault nos chama a atenção para esses processos quando cunha o termo "tecnologias de poder”. As tecnologias de poder são tentativas de manter um certo equilíbrio no poder. O próprio Foucault avalia, de toda forma, e isso é do terreno da práxis, que a forma como essas "tecnologias" provocam uma reação (inesperada) leva frequentemente a efeitos não desejáveis. Por mais "blindado" que esteja o elemento de poder, basta a erosão do equilíbrio que lhe deu sustentação para que essa "blindagem" seja ultrapassada. Se esse equilíbrio se mantiver, entretanto, os obstáculos formais tornam-se puramente redundantes, e se continua a gerir o esquema imagético adequado a seres politicamente enfraquecidos ou não.

É necessário que a totalidade faça sentido. A ideologia se encarrega de urdir as partes conflitantes. Um indivíduo qualquer pode ser um bom cristão dentro da Igreja e autorizar, em nome de deus ou não, a morte de milhares de pessoas em uma câmara de gás (Himmler era um “bom católico”). A máquina abstracta do capital é uma máquina de produção de sentido. Nesse sentido, pode-se incluir por exclusão (a ideologia tudo aceita). Inicia-se, então, uma etapa pragmática de sobrecodificação – é a idéia da inclusão subvertida. O sistema precisa incluir os “excluídos” e reservar um lugar para eles, mesmo que este seja a prisão ou a cova rasa. Os “excluídos” possuem certa funcionalidade no sistema (se não fosse a criminalidade, o que seria do mercado lucrativo das empresas de segurança?).


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